2.1.09

Uma nação, uma seleção

Na faixa, em basco: uma nação, uma seleção, uma federação. Sentimento comum nas diversas regiões autônomas espanholas

A discussão é antiga e as motivações transcendem o campo esportivo. Povos que existem há centenas e centenas de séculos na região da Península Ibérica, tem sua própria língua, cultura e até mesmo gozam de alguma autonomia administrativa, mas oficialmente não possuem um território que seja reconhecidamente pela comunidade social com o conceito de Estado/Nação, por serem parte do território de outros países, geograficamente falando.

As acaloradas discussões acontecem principalmente no território espanhol, uma monarquia unificada mas que é formada por uma série de comunidades autônomas, o que causa a descentralização do poder no país. Das 17 comunidades que formam a Espanha, quatro têm as chamadas Nacionalidades Históricas – reconhecidas pela Constituição de 1978, a primeira depois da chamada transição espanhola após o governo ditatorial de Francisco Franco -, o que lhes garante maior autonomia em relação a outros territórios.

E os territórios que gozam de tal status causam o motivo da polêmica discutidas neste post: Galícia, País Basco, Catalunha e Andaluzia. Por não poderem reunir suas seleções no calendário FIFA de amistosos, as federações locais organizam amistosos de fim de ano para brindar os torcedores, normalmente contra seleções filiadas à FIFA, aproveitando a folga de fim de ano dos clubes espanhóis. Em 2008, a seleção andaluz enfrentou o Peru (2-2), a Galícia jogou contra o Irã (3-2) e a Catalunha – liderada por Bojan (Barcelona) e Verdú (La Coruña) bateu os colombianos por 2-1 no Camp Nou. No País Basco, o amistoso frente ao Irã foi cancelado por uma questão de nomenclatura. Os bascos – autônomos mais radicais na questão separatista, externada nas ações terroristas do ETA – queriam atuar como “Euskal Herria” (literalmente "território basco", que engloba regiões na fronteira entre Espanha e França). No entanto. os próprios cartolas - pressionados políticamente - optaram por Euskadí, o que compreenderia apenas a região basca correspondente à Espanha. Foi o estopim para protestos encabeçados pelos próprios jogadores, em sua maioria pertencentes ao Athletic Bilbao e a Real Sociedad, reconhecidos como clubes-símbolo da causa basca. Principalemente o Athletic, onde só jogadores de origem basca podem envergar suas cores.

O primeiro ministro espanhol, José Luiz Zapatero, já se manisfestou contra a atuação das regiões autônomas em competições e amistosos oficiais: "É impossível pensar numa competição internacional, num confronto entre uma seleção de uma região autônoma e o resto da Espanha". Mesmo com oposição de boa parte da base governista, os autônomos conseguiram algumas vitórias significativas, como a cessão de três das quinze datas de amistosos da seleção espanhola para as seleções regionais em 2009.

A questão é polêmica, porque a FIFA e a UEFA exigem às federações além do aval do país ao qual elas são vinculadas, a criação de uma liga nacional. Um exemplo são as Ilhas Faroe (vinculadas a Dinamarca) e que disputam amistosos e competições oficiais, além do Formuladeildin, o Campeonato Faroês de futebol. Se levadas ao pé da letra, clubes como o Barcelona, Espanyol, Athletic Bilbao, Real Sociedad, Osasuna e La Coruña (para citar os mais conhecidos) não disputariam a Liga Espanhola – na qual se enfrentam regularmente – para disputar ligas distintas, o que significaria perder receitas vultuosas relacionadas ao futebol, como cotas de TV e patrocínios, pois participariam de campeonatos regionais enfraquecidos tecnicamente. As federações sonham com algo semelhante ao que ocorre com a Grã-Bretanha, que mesmo sendo uma unidade, deixa seus integrantes disputarem competições individuais livremente com a bandeira do território a qual pertencem. É comum ver times galeses disputando ligas na Inglaterra, por exemplo, pois essas equipes optaram por disputar as ligas inglesas ao invés das galesas.

Em um tabuleiro que ultrapassa as quatro linhas, os autônomos sonham em um dia serem donos de si mesmos sem intermediários. Questões políticas, econômicas e nacionalistas entram em campo. E ao confrontar outros países, mesmo que por 90 minutos, os defensores da autonomia total sentem-se livres para manifestar todo seu orgulho e cultura diante dos olhos democráticos e liberais do futebol.

Comercial sobre campanha para a oficialização da Seleção catalã - retirada do ar pelos oposicionistas espanhóis - chamada "Uma Nação, uma seleção".



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