31.7.09

O mais valioso

Artigo escrito originalmente para o site Olheiros - http://www.olheiros.net/artigo.aspx?id=1337

Se a geração portuguesa de Luís Figo e Rui Costa iniciou o processo de trazer Portugal de volta aos holofotes do futebol mundial, Cristiano Ronaldo representa a mescla daquela “geração de ouro” lusitana e os talentos da safra seguinte, da qual é o maior ícone. Curiosamente, segue alguns dos passos de Figo, maior talento individual do futebol português após o lendário Eusébio. Além de herdar a camisa 7 e a tarja de capitão envergadas por ele durante o período de 15 anos em que defendeu Portugal – entre 1991 e 2006 –, também é oriundo das categorias de base do Sporting, já foi eleito como o melhor do mundo pela FIFA e se transferiu ao Real Madrid como a contratação mais cara da história do futebol – em 2000, Figo se transferiu por € 61 milhões.

“O Real é o clube mais importante no mundo, o melhor clube do mundo. Acho que Ronaldo já ganhou tudo que podia no Manchester, que é outro grande time, mas ele deveria ter outros objetivos agora. O Real lhe daria a chance de ser mais importante, ser mais relevante”, afirmou Figo ao jornal espanhol Marca. Com 24 anos, Cristiano Ronaldo chega aos merengues a peso de ouro e com a missão de levar a equipe novamente ao topo, ao lado do também estelar Kaká. Acostumado a cobranças e grandes responsabilidades desde cedo e sempre em meio às polêmicas de sua agitada vida extra-campo, é um dos ícones dessa segunda geração galática do Real de Florentino Pérez. E talento para tal, o madeirense já demonstrou que possui.

Talento precoce

Cristiano Ronaldo deu seus primeiros chutes pelo pequeno Andorinha, equipe de sua cidade natal, Funchal. De onde não demorou a se transferir para o Nacional da Ilha da Madeira, em 1993. Com apenas dez anos e após boas apresentações com a equipe alvinegra madeirense, Ronaldo chamou a atenção do Sporting, que o levou para as fileiras de Alcochete, a academia de futebol sportinguista, em 1997. E o Sporting marcaria o início de sua meteórica carreira como atleta profissional.

Com apenas 16 anos, o jovem e rebelde Cristiano foi promovido do sub-16 ao time principal – passando por todas as categorias – em apenas uma temporada. Estreou entre os profissionais aos 17, diante da Inter de Milão, no Estádio José Alvalade, em partida válida pela fase eliminatória da Liga dos Campeões, em agosto de 2002. O então camisa 28 substituiu o espanhol Toñito, aos 13 minutos da etapa final. Contudo, os Leões - comandados pelo romeno Läszlo Bölöni - acabaram eliminados após derrota por 2 a 0. Apesar de algumas boas jogadas, o jovem talento fez partida discreta. Não tardou a estrear como titular na partida da Liga Portuguesa frente ao Moreirense, em outubro de 2002, onde anotou dois gols. Terminaria aquela temporada com 31 partidas e cinco gols marcados. De quebra, já conquistaria ainda o seu primeiro título como profissional, o da Liga Portuguesa.

Sua ascensão meteórica no futebol se acentuaria ainda mais em 2003. Após a inauguração do novo José Alvalade – reconstruído para a Euro 2004 – na partida amistosa contra o Manchester United de Alex Ferguson, Cristiano chamou a atenção do escocês, ao liderar o triunfo de sua equipe sobre os Red Devils por 3 a 1. Sondado anteriormente por Arsenal e Liverpool, o Manchester United não hesitou em gastar 12,5 milhões de libras para contar com o futebol do português, em agosto de 2003, mesmo mês em que foi convocado pela primeira vez para a seleção portuguesa de Felipão. Além da mudança de ares e status, mal sabia Cristiano que, treinado por Felipão e Ferguson, sua evolução técnica no futebol seria gigantesca.

A aposta de Ferguson no camisa 7

Desde o início, Alex Ferguson apostou suas fichas em Ronaldo. Em sua chegada ao Old Trafford, pediu a camisa 28 - a mesma com a qual apareceu profissionalmente pelo Sporting. Mas Ferguson insistiu para que o gajo usasse a mítica camisa 7, defendida por grandes jogadores da história mancuniana como Bobby Robson, George Best, Eric Cantona e David Beckham, como forma de incentivá-lo diante de tão grande desafio. Deu certo.

A estreia de Ronaldo no United aconteceu em agosto de 2003, contra o Bolton, pela Premier League. O primeiro gol pelo veio em novembro, na vitória de 3 a 0 sobre o Portsmouth. A espantosa habilidade e agilidade ainda careciam de um estilo de jogo mais objetivo. Contudo, para uma temporada de estreia aos 18 anos, Cristiano obteve números excelentes: atuou em 40 partidas, marcou seis gols e deu quatro assistências. O primeiro título em Manchester veio na FA Cup, naquela mesma temporada, diante do modesto Milwall. Na vitória por 3 a 0, Ronaldo mostrou personalidade e contribuiu com o gol inaugural da final. Ainda venceria com o Man Utd a Copa da Liga Inglesa em 2005/06, mas era muito jovem e intempestivo para liderar tecnicamente aquela equipe.

Porém, na temporada 2006/07, Ronaldo começou a se tornar peça primordial dos Red Devils. Foi o terceiro artilheiro da Premier League, com 17 gols. Também foi fundamental para levar o time às semifinais da Liga dos Campeões. Mas no duelo particular diante do Milan de Kaká, ele e o United pararam diante da fabulosa temporada do seu futuro companheiro de Real. O brasileiro seria eleito o melhor do mundo naquele ano de 2007, com o português alcançando o segundo posto. Sempre vaidoso com relação aos prêmios individuais - cada vez mais frequentes em sua carreira - passou a perseguir o troféu que havia lhe escapado com o revés para Kaká e o Milan.

A temporada seguinte trouxe a confirmação de todo o seu potencial e técnica e afastou o estigma de jogador “firuleiro” e que “amarela” em jogos decisivos. Em uma temporada impecável, sagrou-se artilheiro da Premier League, com 31 gols e da Liga dos Campeões, com oito. Mas numa situação que só acontece no futebol, Ronaldo quase foi do céu ao inferno em seu grande momento da carreira clubística: a final da Champions contra o Chelsea, disputada em Moscou. Autor do tento que abriu o placar, viu os Blues empatarem e a partida se arrastar para uma dramática decisão por pênaltis.

Na terceira cobrança, o camisa 7 bateu mal e Cech defendeu. No entanto, Terry e Anelka “aliviaram a barra” do gajo, ao desperdiçar as penalidades que fizeram o United campeão europeu. Coroou uma temporada fantástica de 42 gols em 49 partidas, com oito assistências. Ainda ajudou a erguer as taças da Copa da Liga Inglesa, da Community Shield e do Mundial de Clubes da Fifa. Com justiça, alcançou a tão almejada alcunha de melhor do mundo pela Fifa.

Iniciou 2008/09 se recuperando de uma contusão no tornozelo direito que o deixaria fora de combate por quase três meses. Mesmo não repetindo a temporada brilhante anterior, foi peça importante no tricampeonato inglês do Manchester United e no vice-campeonato europeu, após a derrota para o Barcelona. No duelo particular com Messi, Cristiano não rendeu o esperado e viu o rival argentino brilhar com a fabulosa equipe culé. Campeão de quase tudo em seis temporadas no futebol inglês e após 196 jogos e 84 gols pelo United, não fazia mais questão de esconder o desejo de brilhar no Real Madrid, sonho que se concretizou graças à maior transferência da história do futebol: € 94 milhões, com o português convertendo-se no jogador mais bem pago da atualidade, em cifras que atingem os € 13 milhões anuais.

Portugal: de esperança a capitão

Cristiano Ronaldo chegou à seleção portuguesa pela primeira vez em 2002, no Europeu Sub-17. Trajado com a camisa 7, não conseguiu levar Portugal às quartas de final do torneio vencido pelos suíços. Também acumulou passagens pelas equipes sub-18 e sub-21 dos Tugas.

No entanto, seu primeiro grande momento com a seleção lusitana foi durante a Euro 2004, disputada em seus domínios. Com apenas seis convocações, foi chamado por Felipão para a competição. Cristiano saiu do banco marcou seu primeiro gol pela seleção principal na derrota por 2 a 1 frente aos gregos na estreia. Ganhou a vaga na equipe titular a partir da partida contra a Espanha e seguiu nessa condição até a final, inclusive anotando outro tento na semifinal diante da Holanda. Na decisão, amargou a maior decepção da carreira, ao parar na quase intransponível defesa da Grécia, que novamente bateu os portugueses, desta vez por 1 a 0.

Mesmo com a frustração da perda de um campeonato que parecia ganho, Ronaldo seria figura constante nas próximas convocatórias de Portugal. Presente também na seleção olímpica em Atenas 2004 – desta vez como grande estrela do time -, o camisa 7 fez péssimo torneio e foi eliminado do torneio com a seleção portuguesa precocemente, ainda na primeira fase.

Na Copa do Mundo de 2006 foi titular absoluto na campanha do quarto lugar – a melhor desde o terceiro lugar de 1966 – e marcou seu único gol no Mundial da Alemanha diante do Irã, na primeira fase. Na Euro 2008, Portugal era cotada como uma das favoritas ao título. Mas em um continental irregular de Ronaldo e do restante do elenco, os portugueses foram eliminados nas quartas-de-final, na derrota por 3-2 diante dos alemães.

Ronaldo deixou sua marca no torneio, diante da República Tcheca. Promovido provisoriamente à capitão no amistoso entre Brasil e Portugal, disputado no Emirates Stadium, em fevereiro de 2007, o meia-atacante foi, gradualmente, ganhando a tarja em definitivo, principalmente após a chegada de Carlos Queiroz ao comando da seleção. Acumula atualmente pela seleção portuguesa a marca de 64 partidas e 22 gols. Tudo isso com apenas 24 anos de idade e pouco mais de seis deles dedicados à seleção principal.

O sonho Real

Sondado pelo Real desde sua primeira renovação de contrato, em 2007, a vontade de Cristiano em atuar no Santiago Bernabéu foi crescendo gradualmente. O status, a mística e o glamour merengue chamavam sua atenção e cada vez mais especulava-se sobre a sua milionária transferência. Uma oferta de 80 milhões de euros foi feita em 2008, mas o Manchester United relutava em vender sua maior estrela. No entanto, o sucesso do Barcelona na Europa e a volta de Florentino Pérez à presidência do Real foram fatores preponderantes na montagem de um elenco estelar - a reedição dos galácticos, elenco milionário formado pelo mesmo Pérez no início desta década, ao trazer jogadores do quilate de Figo, Zidane e Beckham. A segunda geração promete ser tão badalada quanto a primeira, com as contratações milionárias do próprio Ronaldo (€94 milhões), Kaká (€67 milhões), Benzema (€35 milhões) e Albiol (€15 milhões).

Mais maduro e ao lado do excelente Kaká, o destaque português tem a missão de reconduzir os merengues ao topo da Europa, deixando um pouco de lado a sua individualidade, que, por vezes, é exagerada. Sem nenhuma questão de modéstia após a concretização da maior transferência da história do futebol, cravou: “quero ser o melhor de todos os tempos e fazer história no Real Madrid. Esse é o meu objetivo”. Resta saber se tal pretensão – que soa demasiada - poderá se tornar realidade. Esse é o estilo Ronaldo de ser: técnica, polêmica e megalomania, caminhando juntos.

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