10.3.11

Pequena grande vitória

O jogo era válido pelas Eliminatórias Asiáticas para o torneio de futebol dos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012. Com um golaço à la Zidane (vídeo abaixo), o atacante Abdelhamid Abu Habeeb deu a vantagem à Palestina contra a Tailândia – que havia vencido a primeira eliminatória, em Bangcoc, por 1 a 0 –, mas a seleção palestina acabou eliminada nos pênaltis. A alegria de se comemorar um belo gol e a frustração de uma eliminação, elementos mais do que presentes no futebol, enfim, foram compartilhados pelos torcedores palestinos sob o solo de sua terra, já que este jogo (disputado nesta última quarta-feira) foi o primeiro disputado pela seleção local em seus domínios de forma oficial. É o primeiro passo para que a seleção principal também tenha o gosto de contar com o fator casa em seus próximos desafios – como o torneio era pré-olímpico, a equipe era sub-21.


As 16.450 pessoas presentes ao estádio Faisal Al-Husseini, em Al-Ram – cidade localizada ao norte de Jerusalém, na Cisjordânia – têm a exata noção de que esta partida transcende as quatro linhas. É mais um dos instrumentos para que todos reconheçam seu território, governo e a Palestina como um país, em conflito travado de forma mais acentuada com os israelenses há mais de meio século. E se dizem que a linguagem do futebol é universal, nada mais prático do que usar um esporte que, segundo diversos relatos de reportagens feitas por lá, é uma verdadeira paixão nacional. Por isso, várias autoridades, desde Joseph Blatter, presidente da Fifa, até o primeiro-ministro da Palestina, Salam Fayyad, estavam no estádio para presenciar um dia histórico ao país árabe.

Fundada em 1928 (e recriada em 1953, após a fundação de Israel, em 1948), a Federação Palestina de Futebol só conseguiu se filiar à Fifa e à Federação Asiática (AFC) em 1998, quando foi fundada a Autoridade Nacional Palestina. A instabilidade na região paralisou por algum tempo a liga local (atualmente, batizada como West Bank Premier League) e deixou a seleção local quase que inativa. Após o “retorno”, porém, os Al-Fida'i (Guerreiros, na linguagem árabe) só conseguia disputar partidas oficiais longe de seus torcedores, por conta da falta de segurança da região. Com a ajuda da Fifa, a federação local ergueu um estádio em 2008, no qual recebeu a vizinha Jordânia para a primeira partida em casa, em outubro do mesmo ano (post dos parceiros do Futepoca, aqui). A partida diante dos tailandeses, portanto, é um feito. Mas mostra que o processo de introdução do esporte no país é lenta. Principalmente por dificuldades impostas por Israel, que ocupa parte das áreas que pertenceriam aos palestinos. Ainda assim, além da volta da liga local aos campos do país, em 2008, a Palestina estreou a liga feminina de futebol no último mês de fevereiro. No mesmo palco do jogo histórico contra os tailandeses.

Como boa parte dos territórios ainda tem seu trânsito entre a Faixa de Gaza e a Cisjordânia limitado pelos israelenses, os melhores jogadores disponíveis para treinar não conseguem passar um período em conjunto para entrosamento e aperfeiçoamento técnico. Equipamentos esportivos doados por diversas entidades como a própria Fifa, Uefa e AFC são barrados nas fronteiras. Nos ataques aéreos lançados em janeiro de 2009 por Israel ao território palestino, três jogadores considerados de alto nível do futebol local acabaram mortos em decorrência destas incursões, desencadeadas pelo cessar fogo entre o governo israelense e o Hamas – uma das forças políticas palestinas e considerado por vários países como uma organização terrorista.

Mesmo com o contexto delicado desta região do Oriente Médio – dos 11 jogadores convocados que moravam na Faixa de Gaza, apenas seis tiveram permissão para entrar na Cisjordânia e atuar contra a Tailândia–, a derrota, que poderia ter um gosto amargo por conta da eliminação as chances de ir à Londres, em 2012, tem um sabor especial. O de liberdade e reconhecimento.

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