17.6.09

Onde o Norte reencontra o Sul

Contrastando com as rusgas do regime comunista da Coréia do Norte contra a comunidade internacional - principalmente, os estadunidenses – por conta da reativação de seu programa nuclear e sucessivos testes com mísseis de médio e longo alcance, a seleção norte-coreana trouxe o país de volta ao lado positivo da mídia, ao obter a classificação para a Copa do Mundo após suado empate em 0-0, diante de uma experiente Arábia Saudita – presente nas últimas quatro Copas – que atuava em seus domínios e buscava a vitória que lhes daria a classificação direta à África do Sul. A classificação dos Chollima não deixa de ser grande feito, considerando que a equipe estava em um grupo difícil, ao lado dos já classificados vizinhos da Coréia do Sul, além de Arábia Saudita, Irã e Emirados Árabes, todos com ao menos uma Copa do Mundo no currículo. Em campo, diferem-se dos sul-coreanos – de futebol mais rápido, técnico e dinâmico – pelo seu zelo ao sistema defensivo, até por conta da diferença técnica entre eles. Na fase final das Eliminatórias Asiáticas, foram apenas 13 gols marcados e cinco sofridos em 14 partidas, enquanto que a Coréia do Sul, sempre na mesma chave que o Norte, marcou 22 e sofreu sete. A estrela do time foi o atacante Hong Yong-Jo, do Rostov/RUS, um dos artilheiros do time na campanha classificatória com quatro gols.

Muito comemorada pelos atletas, a classificação para um Mundial após 44 anos de sua única participação – foi quadrifinalista em 1966, tendo como grandes feitos a vitória histórica sobre os italianos e derrota para os portugueses, liderados por Eusébio, por 5-3 após sair com 3-0 de vantagem – parece irrelevante frente ao delicado momento político pelo qual o país atravessa. Mas diversos exemplos do passado mostram que o futebol pode converter-se num instrumento para iniciar um eventual diálogo do regime comunista vigente com os órgãos internacionais como a ONU e a reaproximação com os vizinhos do sul, separados desde o fim da Guerra da Coréia, em 1953.
"Será bom para nós, da mesma nação coreana, irmos para a Copa juntos. Será uma grande honra e fonte de orgulho" (Huh Jung-Moo, técnico da Coréia do Sul, antes da última partida entre as duas equipes, disputada em abril de 2009)

O “Jogo da Paz”, ocorrido na Copa de 1998 entre Irã e Estados Unidos, opôs em campo países com velhas e ferrenhas rusgas, em cenário semelhante ao vivido pela Coréia do Norte. E apesar de todo o clima de hostilidade fora dele, em campo o que se viu foi a troca de gentilezas, muita disputa e vitória dos iranianos por 2-1. Nas Eliminatórias Asiáticas para a Copa de 2010, Coréias do Sul e Norte se enfrentaram quatro vezes, com três empates e uma vitória dos sul-coreanos na última partida. As diferenças políticas fizeram com que as duas partidas de mando dos norte-coreanos fossem disputadas em campo neutro, na China, por conta da intransigência do regime de Kim Jong-Il em exibir a bandeira e tocar o hino dos vizinhos e adversários em seu solo. Ainda assim, o clima entre os torcedores na primeira partida entre as duas seleções na China era de muita cordialidade, principalmente da parte dos sulistas para com os nortistas, mais contidos até mesmo por viverem sob um regime de constante repressão.

Mesmo com o diálogo difícil, as duas partes já deram pequenos sinais de reaproximação através do esporte ao disputar em Pyongyang, capital do norte, o último amistoso de futebol entre ambas sob a mesma bandeira, em 1990. Ou desfilar nos Jogos Olímpicos de Sydney e Atenas também sob o mesmo símbolo. Em um momento tão delicado, a neutralidade dos gramados sul-africanos pode amenizar as tensões sobre um possível conflito ou até mesmo inspirar a retomada de entendimentos entre a Coréia do Norte e a comunidade internacional. Como disse Pedro Bassan, à época fazendo a reportagem para o Esporte Espetacular durante a cobertura da primeira partida das Eliminatórias entre os rivais em Xangai (que infelizmente não encontrei para disponibilizar aqui): “o dia em que este jogo não existir, o mundo será um pouquinho melhor”.

*Post redigido para a série “Como o esporte gira em torno do mundo”, proposta por Breiller Pires, do Rola Blog. Para acomapnhar os outros posts, escritos por diversos blogueiros, visite o RB ou acesse os textos via twitter, pela tag #esportemundo

4 comentários:

Felipe Moraes disse...

Bela matéria, André.

Só mesmo o futebol para fazer esquecer disputas políticas e ódio entre nações inimigas.

Abraço,
Felipe Moraes

Armando Teixeira Junior disse...

Pois é... não só o futebol, mas o esporte sempre faz o papel de embaixador da paz, pena que ainda existam aqueles que resistam as formas pacíficas de protesto, como o presidente iraniano Ahmadinejad, que obrigou quatro jogadores do país a retirar no intervalo do jogo contra a Coréia do Sul pulseiras que significavam apoio a oposição do atual presidente.
Lamentável a posição de alguns líderes ....

Abraços !

Breiller disse...

Execelente, André. A Coreia do Norte volta à Copa num momento mais que oportuno. Bacana ver as declarações dos jogadores e comissão técnica da Coreia do Sul. Eles mesmo torciam pela classificação dos norte-coreanos. E muita gente dizendo que sul-coreanos iriam entregar jogos para desclassificar os "co-irmãos" do Norte.

Felizmente, a divergência se restringe apenas à esfera política. No fundo, coreanos queriam mesmo era estar próximos uns dos outros, e o futebol, ainda que por pouco tempo, serve como ferramenta para essa reaproximação.

Thaís Poggio disse...

Oláá´!!

Tudo bem?
Muito legal o texto que você fez para o Dia Olimpico Universal!!

A iniciativa do Breiller foi muito boa né?

De uma conferida no texto que o Renan escreveu também!

www.ligadonabola.com.br